Parece que não faz diferença nenhuma se a lama fez ou não barulho quando derramada, mas dizem que um morador do Parque da Cachoeira conseguiu se salvar porque, junto ao barulho, da gritaria enlouquecida dos macacos, ele também pôde ouvir o crepitar de uma fogueira. Eram estalos de uma floresta destruída.
Parece que não faz diferença se o que vi numa tela foi uma ponte, uma barragem ou uma barreira sendo comida por lama, arrastando casas, soterrando pessoas em 36 ou em 37 segundos. Parece que não faz diferença se os pataxós viviam suas vidas à margem do rio em uma pequena ilha no Rio Paraopeba, onde comiam, cantavam e contavam suas histórias, e agora esse local está envenenado. Tão envenenado que pode matar o pequeno cão Carrapicho, o xodó das crianças da aldeia dos pataxós.
Parece que não importa se essas crianças, mesmo rindo e brincando numa roda de palhaços e palhaças, ainda dormem de mochilas prontas e se apavoram com qualquer barulho alto, deixam na mala pão e água, para caso outra matança aconteça. Não importa se a palavra certa para descrever a “tragédia” de Brumadinho seja essa, matança, chacina, ou crime. Não importa que Brumadinho viva hoje uma situação, não triste, mas apavorante.
Portanto, convido aqueles que se sentem tocados com a “tragédia” de Brumadinho a conhecerem a fundo o caso. Procurem pessoas da região para ouvirem e saberem como seu trabalho pode (ou não) ser útil para a cidade. Eu acredito que sua presença pode fazer diferença, por menor que seja, até porque os grandes helicópteros e câmeras filmadoras já não passam por aqui.
Diário de bordo de Risoto de Carne Moída, o Francis Severino, no Projeto Brumadinho, uma colaboração entre Palhaços Sem Fronteiras Brasil e Instituto HAHAHA.